segunda-feira, 24 de setembro de 2012

O nervosismo de Margarida






"Saiu do carro, deixou a porta aberta. De dentro, o rádio repetia os Rolling Stones e Angie era de novo a banda sonora dos seus momentos.
Margarida acendeu um cigarro, com o indicador da mão direita enrolou o cabelo, à altura do ombro. Algumas coisas não mudam, o gesto das mãos finas de Margarida, os longos dedos a enrolar o cabelo, tinham o mesmo glamour de sempre.
Margarida continuava bela, elegante, embora mais mirrada, marcada pela vida. Os socalcos do seu Douro, para além de terem um lugar na sua alma, também ganhavam terreno, em forma de rugas, na pele da sua cara.
Já não era a miúda que tinha chegado ali com um monte de ilusões. Por ela havia passado uma vida, muitas vidas. Hoje, no sentido literal da palavra, sabia muito bem o que queria.
Decidida como sempre quis ser reconhecida, pegou no envelope e começou por descolar o lado esquerdo da aba.
Parou, afinal até nas suas decisões estava menos intempestiva. Mais moderada, sentou-se numa pedra ao lado da capela de São Salvador do Mundo e acendeu mais um cigarro no que estava a terminar."

Excerto do meu próximo romance a ser publicado brevemente.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Presságio




Enleias-te por caminhos do encanto
Nessa falsa promessa de advento
Ruminando insensatez em verde prado
E digerindo a acidez do ensinamento

Lá onde repousa a insensatez
De vazio se enche o recetivo ventre
Petrifica no bandulho a incerteza
Frugal, leva o longe que era um sonho

Mas, o sono é leve como a alma
E entre aquilo que retinhas
O infinito, esse mito alienável
Ficaram só amarras de esperança

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Vaga




Vago é o olhar da solidão
Em ti ausente escuro como breu
A distância que o vazio preencheu
Naquele ai em que o coração vagou

Vago é o vazio da memória
no impertinente gelo da emoção
que espreme o verde sulco em lento pranto
e verga perante a vaga a resistência
mesmo que dura seja a forte fraga
e a alma em si a tome como alento

Em lágrimas pulveriza o sentimento
Que imensa é a breve recordação